
I
Minha carne renascida
nunca pode ser um bem perdido
a nossa amizade através da vida
assim o queiramos
não há-de
sabes, filho querido
surgem barreiras de emoção
a toldarem-me a voz
mesmo assim, amigo
desprezo rancores ou piedade
por nós
tão iguais no protesto interior e diário
tão firmes no justo ideal da vitória inevitável
e com isto
não precisamos de mais nada
II
Para além dos laços do sangue e da carne
que nos ligam indissoluvelmente
amo-te porque te conheço
porque
sei que não julgas o semelhante apenas pelos actos
mas pelas razões que os consumaram
sei que não partilhas ideais com facciosismos
mas defendes opções de consciência
sei que não esbanjas a juventude refastelado no presente
mas trilhas a rota aliciante dum futuro melhor
sei que não aceitas os dogmas do capitalismo
mas desprezas “os outros” que exploram os homens
sei que não lamentas os inevitáveis condenados
mas canta-los, orgulhoso e solidário
sei que não pretendes a “liberdade” dos poderosos
mas a ditadura da Justiça
sei que não lês imprensas de encomenda
mas abres o espírito à cultura
sei que não trajas cerimónias em banquetes
mas vestes o teu fato honestamente
sei que te estremecerei até
e para além da morte
porque, filho meu, de mim nasceste
num homem te tornaste
porque meu camarada permaneces
porque os mesmos sangues
e os mesmos sagrados ideais
nos abraçam
Lisboa, Maio 1973
Sem comentários:
Enviar um comentário